Não, nunca me acontecem milagres. Ouço falar, e às vezes isso me basta como esperança. Mas também me revolta: por que não a mim? Por que só de ouvir falar? Pois já cheguei a ouvir conversas assim, sobre milagres: “Avisou-me que, ao ser dita determinada palavra, um objeto de estimação se quebraria.” Meus objetos se quebram banalmente e pelas mãos das empregadas. Até que fui obrigada a chegar à conclusão de que sou daqueles que rolam pedras durante séculos, e não daqueles para os quais os seixos já vêm prontos, polidos e brancos. Bem que tenho visões fugitivas antes de adormecer – seria milagre? Mas já me foi tranquilamente explicado que isso até nome tem: cidetismo, capacidade de projetar no campo alucinatório as imagens inconscientes.
Milagre, não. Mas as coincidências. Vivo de coincidências, vivo de linhas que incidem uma na outra e se cruzam e no cruzamento formam um leve e instantâneo ponto, tão leve e instantâneo que mais é feito de pudor e segredo: mal eu falasse nele, já estaria falando em nada.
Mas tenho um milagre, sim. O milagre das folhas. Estou andando pela rua e do vento me cai uma folha exatamente nos cabelos. A incidência da linha de milhares de folhas transformadas em uma única, e de milhões de pessoas a incidência de reduzi-las a mim. Isso me acontece tantas vezes que passei a me considerar modestamente a escolhida das folhas. Com gestos furtivos tiro a folha dos cabelos e guardo-a na bolsa, como o mais diminuto diamante. Até que um dia, abrindo a bolsa, encontro entre os objetos a folha seca, engelhada, morta. Jogo-a fora: não me interessa fetiche morto como lembrança. E também porque sei que novas folhas coincidirão comigo.
Um dia uma folha me bateu nos cílios. Achei Deus de uma grande delicadeza”. Clarice Lispector
8 comentários:
Olá Veloso...obrigado pela confirmação amigo.
Muito lindo esse depoimnto da Clarice...tive uma época m que borboletas ficavam me rondando...rsrss
Deixa eu te falar, quando puder envia pra gnte então umas tres tirinhas de sua escolha para fazrmos a postagem, se for posivel mande também um pequeno curriculo seu com uma foto para que as pessoas saibam um pouco mais de você ok...
Um abraço na alma...bom domingo, assim que você enviar te passamos a data da postagem ok...pode ser por ste e-mail...
tuiribepi64@gmail.com ou pelo do blog ou no da Tatiana ok...
valeu amigo....obrigado mesmo...
lindo texto
Veloso, as palavras de Clarice são sempre carregadas de sentimentos e verdades.
Gosto muito dela, através do que leio.
Um beijo
Hoje parecia um dia tão comum ,até eu trombar com esse lindo texto!
VALEU Bonéco!
Nossa, que coisa linda!
Boa escolha, mais que do que o texto, a tua escolha ao coloca-lo no teu post, mostra muito de você amigo.
As entrelinhas, são elas o milagre da vida.
Um grande beijo
Gemária Sampaio
Maravilhoso depoimento e muito verdadeiro.
Parabénsssssssssss.
Beijos mil
Eu poderia falar do milagre dos pássaros que coincidência ou não, vira e mexe me acertam com seus cocos voadores.
Foi prazer conhecer o Baú do Veloso.
Abraço,
Manoel
Saudações mano Veloso, vim agradecer sua presença lá no blog, fico muito feliz quando vejo um comentário seu. Tenho notado que estás muito ativo no Face, tenho acompanhando suas postagens. Seu traço sempre me fascina, de verdade.
Formoso este texto da postagem. Comigo é bem assim, tenho até um milagre semelhante ao da Clarice. Sempre que estaciono meu carro e tem alguma árvore nas imediações ele fica coberto de pétalas de flores e folhas. Na época em que trampei na universidade acontecia direto, rsrsrsrsrs. Fica parecendo o carro do Renato Russo, rsrsrsrs.
Grande abraço, saúde, inspiração, bons momentos e muita paz interior.
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